Por Sérgio Schwartsman
Ultimamente um problema social relacionado ao trabalho foi inserido no mundo jurídico e especificamente em processos trabalhistas, qual seja, o assédio moral, de modo que hoje é tratado e analisado na legislação, jurisprudência e doutrina de inúmeros países. Pode-se afirmar, sem medo de errar, que hoje o assédio moral nas relações de trabalho é um dos problemas mais sérios enfrentados pela sociedade atual.
Neste tipo de situação, a vítima, ou assediado, é submetida a processo sistemático de usurpação de seus direitos através de perseguições, humilhações e constrangimentos, sempre de forma repetitiva, durante a jornada de trabalho. Ou seja, trata-se de violência psicológica, empregada de forma repetitiva e duradoura, visando enfraquecer o assediado, até que não aguente mais trabalhar naquele local e acabe se desligando do emprego.
É importante mencionar que assédio moral causa graves prejuízos aos empregadores, eis que com o clima de trabalho ruim as pessoas trabalham com medo e com isso têm bloqueio de novas ideias. Além disso, a pressão psicológica pode levar a afastamento, que se apurado como sendo decorrente do trabalho, implicará em custos ao empregador, além de eventual indenização estabelecida pelo Poder Judiciário. E mesmo que não seja apurada decorrente do trabalho, implicará em benefício previdenciário e mesmo aposentadoria, gerando custo a toda a sociedade.
Para que tudo isso não se verifique é necessário que as organizações enfrentem a questão do assédio moral e tomem medidas visando coibir a ocorrência do mesmo, ou seja, devem ter preocupação com as pessoas da organização e não apenas com resultados, devem fazer acompanhamento psicológico de seus colaboradores, além de abrir canais de denúncias e apuração acerca desse comportamento.
Segundo Sônia A. C. Mascaro Nascimento1, o assédio moral caracteriza-se através “da conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetitiva e prolongada, e que expõe o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica, e que tenha por efeito excluir a posição do empregado no emprego ou deteriorar o ambiente de trabalho, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções.”
Assim também é o entendimento de André Luiz Souza Aguiar2:
“O que configura o assédio moral, em verdade, é a repetição e a permanência dessas atitudes que atentam contra o trabalhador, atingindo sua autoestima e sua segurança como indivíduo, levando-o a um desequilíbrio emocional e abrindo espaço para a proliferação de doenças que o incapacitam para o exercício de sua função.”
Para Márcia Novaes Guedes assédio moral se caracteriza como:
“Todos aqueles atos e comportamentos provindos do patrão, gerente, ou superior hierárquico ou colegas, que traduzem uma atitude de contínua e ostensiva perseguição que possa acarretar danos relevantes às condições físicas, psíquicas e morais da vítima”3.
Como se vê, todos são unânimes em tratar da questão relacionada à repetição (cabendo destacar ser impossível seria fixar número de atos, ou a reiteração num espaço de tempo determinado, para a sua caracterização, devendo ser analisado cada caso de forma isolada para apuração ou não do assédio), pelo que, um único e isolado ato não deve ser caracterizado como assédio moral (mas poderá ser caracterizar de dano moral).
Deve, ainda, estar presente interesse minimamente consciente por parte do assediador de prejudicar a vítima, de humilhá-la. São atitudes, palavras, comportamentos, que, tomados separadamente, podem parecer inofensivos, mas cuja repetição os torna destruidores ou desestabilizadores.
São exemplos de atos que configuram a prática do assédio moral: gritar, xingar, apelidar, contar piadas para denegrir, ridicularizar e humilhar; ordenar a realização de tarefas impossíveis ou incompatíveis com a capacidade profissional; sonegar informações indispensáveis ao desempenho das funções; repetir críticas e comentários improcedentes ou que subestime os esforços do empregado
À luz do exposto, é necessário também identificar quais situações não configuram assédio moral. O assédio não pode ser confundido com o estresse ou pressão no trabalho.
No ambiente de trabalho, as relações interpessoais são dinâmicas e envolvem conflitos, atritos, opiniões e condutas divergentes. Tais ocorrências são normais e geram até mesmo um equilíbrio na organização. Não se pode, pois, confundir opiniões e condutas divergentes com assédio moral, sob pena de se descaracterizar tal instituto. Desentendimentos e conflitos individuais podem gerar um mero estresse, diferentemente, pois, de configurar-se o assédio moral.
Claro que isso não acaba com poder diretivo do empregador, mas este tem imites, não podendo violar direitos fundamentais do empregado, como os direitos da personalidade.
É importante destacar que o assédio moral pode ser vertical ou horizontal, ou seja, praticado por pessoas em diferentes níveis hierárquicos (vertical, que pode ser ascedente ou descendente) ou pelo mesma posição na hierarquia da organização (horizontal).
O assédio moral trará custos à organização, pois além da própria indenização a esse título, pode haver a rescisão do contrato, com necessidade de pagamento das verbas rescisórias, que pode custar caro ao empregador.
E destaque-se que a organização é responsável pelos atos de seus prepostos, pelo que, se houver alguma indenização a ser paga, essa será devida pela organização e não pela pessoa do assediante (embora haja o direito de Ação de regresso contra este).
Além das questões relacionadas ao Direito do Trabalho, alguns doutrinadores prelecionam que tais condutas constrangedoras, decorrentes da relação empregatícia, poderão ainda ser tipificadas como crimes e, também as agressões físicas praticadas contra outros empregados no âmbito da empresa, como crime de constrangimento ilegal, de acordo com o artigo 146, todos do Código Penal Brasileiro. Nesse caso, a responsabilidade é pessoal do assediante.
Como o dano moral é uma lesão a direito subjetivo, torna-se difícil sua valoração para fins de indenização, mas este indenização tem duas finalidades (i) reparar o dano causado e (ii) coibir a prática de novos atos da mesma natureza por parte do assediador.
Portanto, é de suma importância enfrentar a questão do assédio moral dentro da organização, seja de forma preventiva para evitar a ocorrência e, se já tiver ocorrido, repressoras, aplicando punição aos responsáveis.
Para ajudar na conscientização dos trabalhadores e no estabelecimento de regras éticas e disciplinares, é necessária a criação de canais de confiança para receber denúncias e queixas sobre o assédio moral, escutar e analisar a situação da vítima. Assim, a existência de uma ouvidoria interna é extremamente importante para receber as denúncias, apurá-las e, se o caso, aplicar as penalidades cabíveis.
É necessário que as empresas adotem ações efetivas para o combate do assédio moral no ambiente de trabalho. Precisam zelar pela saúde física e psicológica dos trabalhadores e do seu futuro como instituição. Precisam preservar o meio ambiente laboral, prestigiando o prazer e a dedicação dos empregados pelo trabalho.
Sérgio Schwartsman, Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Foi professor assistente de Direito Processual do Trabalho na PUC/SP. Palestrante, Co-Coordenador e Co-Autor dos Livros “Aspectos Modernos do Direito Trabalhista Empresarial” e “O Direito Individual do Trabalho – Argentina. Brasil. Uruguai”. Co-Autor do Livro “Recuperação Judicial da Necessidade à oportunidade”. Professor Convidado para o módulo de Direito Empresarial do Trabalho no LLM em Direito Empresarial – Negócios e Tributos do Instituto Business Group – IBG”.
1 In O assédio moral no ambiente do trabalho, http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5433, acesso em 11.07.2007 2In Assédio Moral, 2ª ed. Editora LTr. 2006. P. 131 3 Id. ibid., p. 33.
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