Por muitos anos, a Caixa de Assistência aos Advogados do Rio de Janeiro, ou sua sigla, Caarj, foi sinônimo de plano de saúde. Seu nome pendia junto a Amil, Unimed e outros tantos nos consultórios médicos fluminenses e, para muitos advogados fluminense, esse era o ponto de encontro deles com a entidade. O sistema, porém, começou a apresentar problemas insanáveis e a carteira foi vendida. Agora, o presidente da entidade, Marcello Oliveira, quer que a caixa seja lembrada pelos advogados pela assistência em quatro áreas: social, cultural, bem estar e, mais uma vez, saúde.
Criada em 1942, a Caarj já foi figura relevante nas eleições para a seccional fluminense da OAB: as dívidas milionárias contraídas por conta do plano de saúde próprio foram motivo de sérias acusações entre situação e oposição no pleito de 2009. Naquele momento, porém, o plano de saúde — inaugurado em 1990 — já havia estava sendo vendido, o quadro de funcionários fora reduzido e teve início o pagamento das dívidas com conveniadas, que beiravam R$ 70 milhões. As dívidas tributárias somam cerca de R$ 400 mil, mas são discutidas na Justiça. A situação levou a melhor e o então presidente Wadih Damous foi reeleito. Presidente da Caarj de 2010 e 2012, Felipe Santa Cruz assumiu a liderança OAB-RJ no final do ano passado. O comando da caixa — cargo disputadíssimo nas formações de chapa para a OAB — ficou então com Marcello Oliveira. Oliveira veio à redação da revista Consultor Jurídico explicar o desafio deste triênio: dar continuidade ao processo de recuperação financeira, que depende também do julgamento em que o Supremo Tribunal Federal definirá se as caixas de assistência têm imunidade tributária, e aproximar a Caarj dos 120 mil advogados registrados no Rio de Janeiro. Na década de 1990, então estudante de Direito, Oliveira foi um dos líderes do movimento estudantil na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, comandando o Centro Acadêmico de Direito e atuando como coordenador-geral do DCE. Após nove anos no escritório Xavier, Bernardes e Bragança, ele uniu-se ao advogado Marcelo Mello e, em 2011, abriu banca própria. Simultaneamente, galgava postos na direção da OAB-RJ, primeiro como presidente da Comissão de Exame entre 2007 e 2009 e, posteriormente, como diretor-tesoureiro e coordenador-geral de Comissões, posto que ocupou entre 2010 e 2012. Leia a entrevista: ConJur — Qual é a missão da Caarj nesta gestão? Marcello Oliveira — A caixa é um braço de apoio da Ordem para instrumentalização da advocacia, mas ela precisa buscar nas suas origens a informação do que é a essência da caixa de assistência. O próprio nome já diz, ela existe para prestar assistência. O que a gente entende que vai ser a marca desse triênio é dar assistência ao advogado da porta do seu escritório para fora. Hoje, a gente está focando a nossa comunicação principalmente nisso. Eu preciso não só conhecer esse advogado, mas também o entorno dele, saber informações da família, se ele tem algum parente com uma doença crônica, para que eu possa dar de fato assistência. Vamos trabalhar com atividades que também privilegiem a mudança de comportamento do advogado. Eu quero entender, por exemplo, qual é a realidade do advogado, em que município ele está, que equipamento de lazer ele tem em seu entorno. No Rio de Janeiro, por exemplo, foi inaugurado o Parque de Madureira, em uma área carente de equipamentos públicos. Nós, com o eixo de atuação Caarj Bem Estar, vamos instalar uma tenda de acompanhamento e aconselhamento dos advogados que façam exercícios físicos naquela área. Isso permite que esse advogado tenha uma mudança de comportamento no seu dia a dia, uma melhor condição física no seu trabalho, uma melhor condição psicológica. Nós dividimos a nossa entidade em quatro eixos. O eixo fundamental, que origina a Caixa de Assistência, é o eixo social. Nós identificamos três ou quatro linhas de beneficio que a gente pode oferecer ao advogado. Dois projetos foram criados na gestão passada, o Projeto Nascer e o Projeto Aprender. O primeiro é voltado para a advogada grávida, para que tenha uma ajuda com valor próximo à anuidade. O outro é para que o advogado tenha um recurso adicional para comprar materiais e pagar matricula do filho em idade escolar. Há também o Auxílio Funeral, que eu imagino que todas as caixas [de assistência] têm. Para que tenhamos uma visão de comportamento, de saúde e da situação socioeconômica do advogado, estamos contratando duas pesquisas. Uma delas é um filtro do Censo de 2010 do IBGE, que vai apontar o perfil socioeconômico dos advogados do estado. Outra é uma pesquisa de comportamento e saúde, incluindo coleta de dados e material, como sangue. ConJur — E aí a ideia é aproveitar esse estudo para fazer um trabalho preventivo? Marcello Oliveira — Exatamente. A gente parte para um segundo momento, que é de individualizar essa informação. Eu já terei uma informação sobre a coletividade, eu vou saber se aquele advogado está ou não enquadrado em uma determinada faixa. Eu acho que isso vai beneficiar o Brasil todo, porque o modelo poderá ser reproduzido. O segundo eixo é a Caarj Vida, que concentra os produtos e serviços relacionados à saúde. Através de parcerias, nós oferecemos, através do programa Prevenção Itinerante, medição de glicose, colesterol, pressão e começamos também, em parceria com as prefeituras, a vacinação contra gripe. Já foram vacinados mais de 2,5 mil advogados, e o custo médio da dose no Rio de Janeiro é de R$ 100. Tem também o Goldental, o plano odontológico da Golden Cross que oferecemos a todos os advogados. A novidade está nos dois eixos seguintes. O terceiro é o Caarj Bem Estar. São ações para que o advogado faça atividade física. O foco é fazer com que ele mude seus hábitos. Se ele incorporar uma caminhada, mesmo que seja em volta do quarteirão do trabalho, ele está mudando o padrão dele. O principal projeto do eixo é o das tendas, que são núcleos de promoção, de qualidade de vida, com um professor de educação física e dois estagiários que vão orientar os exercícios físicos. O objetivo é atender o advogado e quem estiver com ele. Na tenda, será montada uma grade de exercício, e ele e sua família vão poder acompanhar on-line o desenvolvimento, o que depois pode se desdobrar em aplicativo para telefones celulares. A ideia foi montar a tenda no local em que o advogado já frequenta. Isso tem a desvantagem de não comunicar com o advogado que está no escritório, mas cria a cultura do envolvimento da Caarj no dia a dia e no lazer do profissional. Nos últimos anos, nós tentamos atrair o advogado para a própria sede e os espaços de convivência da Ordem. Agora, damos um passo para buscá-lo onde ele está, mostrando que está interessado em atuar e interferir em outros ambientes, agregar algo que ele talvez não tenha. O projeto começa em quatro pontos: a praia de Copacabana, que reúne muitos advogados da 3ª idade, o Parque de Madureira, a praia de Icaraí, em Niterói, que também tem muitos advogados, e uma alternando entre o Aterro do Flamengo e o Maracanã. Com parcerias e recursos locais, dá para expandir até a Baixada Fluminense, Região Serrana e outras cidades. Em Resende, por exemplo, devemos lançar em breve. Outra ideia é criar um clube, não precisa ser uma coisa extensiva, mas conseguir a cessão de alguma área para montar um campo de futebol, alguma coisa simples, mas que vire um espaço de congregação fora do escritório. O quarto ramo é o Cultural, que começou com um convênio com os teatros, garantindo 50% de desconto. Queremos fechar acordos também com outros locais, e isso depende de mostrar a importância que a classe tem. Só no Rio de Janeiro, são 120 mil pessoas, se você incluir as famílias, chega a 400 mil pessoas. ConJur — Como convencer o advogado a se exercitar se ele já trabalha muito e, muitas vezes, precisa escolher entre a família, complementar a educação ou praticar um esporte? Marcello Oliveira — Não dá para tirar o advogado da família, e é por isso que não tem sentido oferecer uma atividade que distancie ele dos parentes. A ideia é que a abordagem ocorra quando ele está procurando uma atividade para fazer em família. O profissional precisa ter consciência de que mudar seu comportamento é importante. Eu não consigo fisicamente tirar ele do escritório, mas a partir do momento que ela fecha a porta, eu posso ir atrás e mostrar que a Caarj está se importando com ele, e sugerir que ele atraia outros colegas. ConJur — Como está a relação entre as caixas de assistência no Brasil? Há alguma mudança no foco de atuação das outras seccionais? Marcello Oliveira — Temos trabalhado parcerias. Para nós, o Rio de Janeiro tem essa responsabilidade, não só de compartilhar ideias, mas de compartilhar os resultados do que é executado no Rio de Janeiro. O Paraná é um grande parceiro, mas estamos com contatos bons em todo o Brasil. Estamos com muita vontade de dividir informações com as outras seccionais. A gente quer mostrar que tem capacidade de gerar política boa para a classe. Cada caixa tem a sua história e o seu leque de serviços e produtos, mas eu acho que, agora, todos os presidentes de caixa estão imbuídos do espírito de proporcionar ferramentas para facilitar o acesso ao mundo digital. Há um consenso de que o processo eletrônico criou outra advocacia, e se a OAB não se preparar para isso, ela se tornará obsoleta. ConJur — Qual é a atuação da Caarj em relação ao processo eletrônico? Marcello Oliveira — O advogado precisa de uma sala bem aparelhada. No triênio anterior, trabalhamos para modernizar essas salas, porque a gente entendia que isso era uma premissa, as salas dos advogados precisavam ser modernizadas, e nós modernizamos o estado inteiro. Tanto que o Rio de Janeiro, junto com o Paraná, é tido como modelos da inclusão digital no Brasil. A gente deu otoken de graça para o Rio de Janeiro inteiro. Não podemos parar essa modernização, mas nós estamos em um momento em que essas atividades foram incorporadas automaticamente. Hoje, quando vai à entidade, o advogado já sabe onde fazer certificação digital e onde buscar assistência dos núcleos de inclusão digital para fazer o peticionamento eletrônico. Agora, o que a gente precisa fazer é evoluir para uma próxima etapa. ConJur — O fato de cada Tribunal exigir o processo digital de um jeito dificulta a organização da Ordem? Marcello Oliveira — A gente não pode se perder. O processo eletrônico atropelou o processo natural, em relação aos tribunais e em relação à advocacia. A própria lei do processo eletrônico estabelece que os tribunais devem prover os meios necessários para que o cidadão e o advogado possam acessar a Justiça. Se o processo eletrônico é uma realidade, vamos ter que fazer capacitação. E aí a gente consegue algumas parcerias com os tribunais, mas grande parte do peso recai sobre a Ordem. ConJur — A gente vê no site da Caarj que talvez a grande conquista para Caixa nos últimos anos tenha sido a mudança do plano de saúde. Como foi esse processo? Marcello Oliveira — Esse é o tema talvez mais importante para que a gente possa entender o que a caixa se tornou. O nosso grupo entrou a partir de 2007 com o Wadih Damous na presidência da Ordem, passando por esse ultimo triênio, em que a Caarj foi presidida pelo Felipe Santa Cruz, e chegando até os dias de hoje. A própria eleição desse grupo aconteceu em um momento em que a caixa passava por um desgaste muito grande. E o desgaste é em parte ocasionado pela dificuldade de atendimentos dos advogados. A Caarj era autogestora dos seus planos. Então, nós sentimos que os advogados estavam muito insatisfeitos com o atendimento, estavam muito insatisfeitos com o plano de saúde, eles não eram atendidos, a todo momento a gente recebia a notícia de que um determinado hospital ou clinica descredenciava a Caarj. ConJur — O descredenciamento foi alto? Marcello Oliveira — Muito. Inclusive com anúncios nos jornais e tudo o mais. Então, isso gerou uma descrença muito grande na Caarj, ela estava muito disseminada. Você já tinha um decréscimo perceptível, muito grande, de advogados em relação ao total de vidas que se beneficiavam com o plano. Nós fomos com o tempo descobrindo que esse mercado de planos de saúde se tornou um mercado muito difícil, com o mercado recebendo uma regulação rigorosa. Foi criada a Agência Nacional de Saúde, o mercado de plano de saúde se concentrou e outros problemas de gestão foram identificados. Para ter ideia dos problemas, em 2007, os gestores da Caarj contrataram uma auditoria e o auditor tomou seis ou sete tiros. Eu não sei nem qual é a situação desse rapaz hoje. Mas ele foi alvejado, um volume absurdo de processos sumiu dos arquivos da caixa, encostaram um caminhão próximo de um armazém onde esses arquivos estavam concentrados e levaram esses arquivos. Tanto que há inquérito policial que apura hoje a autoria desse fato. Nós identificamos que a Caixa de Assistência devia à rede credenciada mais de R$ 70 milhões. Entre 2007 e 2009, fizemos um trabalho muito forte de negociação dessa divida com a rede credenciada. Ela foi reduzida pela metade e chega a cerca de R$ 34 milhões. Identificamos que a autogestão não era mais a saída, gerir um negócio dessa natureza é extremamente complicado. Então, a gente começou a trilhar um outro caminho. E o que de fato conteve essa sangria foi a venda do plano de saúde para Unimed. Essa venda foi homologada pela Agência Nacional de Saúde. ConJur — Hoje a caixa faz o meio de campo entre advogado e outros planos de saúde? Marcello Oliveira — Nós atendemos advogados que buscam algum tipo de informação e assistência, meramente porque entendemos que o advogado precisa de um respaldo. Mas não por obrigação, porque o nosso contrato prevê que todas as obrigações foram transferidas ao Unimed. ConJur — Se um advogado busca um plano de saúde, a Caarj tem algo a oferecer para ele? Marcello Oliveira — Temos o convenio com a Qualicorp, que é uma administradora de planos. Ela oferece valores melhores do que o advogado conseguiria individualmente com um plano de saúde, mas não é um plano coletivo, é um plano individual. Nós contratamos o plano odontológico sem nenhum valor adicional, para todos os advogados do Rio de Janeiro. Ao invés de ter um consultório odontológico que custava uma fortuna e atendia poucos profissionais, a gente contratou um plano odontológico. As políticas hoje são construídas com base nessa filosofia: Eu tenho que fazer aquele valor da anuidade valer. A anuidade não é barata, ela está em R$ 780. ConJur — A dívida oriunda do plano de saúde é o único débito da Caarj? Qual é o valor total da dívida da Caixa? Marcello Oliveira — A principal divida é com a Fazenda, por conta da autuação fiscal das receitas decorrentes do plano de saúde. O total supera R$ 400 milhões, e para reduzir esse valor, é fundamental obter a imunidade tributária, porque a caixa é um órgão da OAB. Se o Supremo não conceder a imunidade tributária, a gente vai virar um clube de futebol, só administrando a dívida, que hoje é estratosférica. Eu até consigo conviver com R$ 34 milhões, mas com essa dívida de R$ 400 milhões é impraticável. Outros estados não tiveram um plano de saúde tão grande quanto o do Rio de Janeiro. Sem o plano de saúde, o número de funcionários, por exemplo, caiu de 800 para 100, o que gera muitos problemas trabalhistas. Hoje, o caixa é constantemente atacado por penhoras, e isso me dá duas opções: baixar a cabeça e ser um gestor financeiro ou administrar a situação e multiplicar o pouco que eu tenho, mas não é fácil. ConJur — Como é o repasse da OAB para a Caarj? Marcello Oliveira — Ele é de 20%, e é fundamental para nós, mas para a Ordem também é. Assim, é comum que algumas seccionais usem essa verba para necessidades emergenciais. Existem algumas diferenças entre cada caixa com relação às receitas próprias. No Rio de Janeiro, por exemplo, a gente tem uma peculiaridade, que é ficar com um percentual do repasse de custas processuais. Isso é algo que está sendo debatido pelo Conselho Nacional de Justiça, que quer extinguir esse repasse. A OAB garante em torno de 60% do orçamento e os outros quase que 40% são deste repasse das custas. Na votação sobre a imunidade tributária no STF, o [ministro] Joaquim Barbosa afirmou que a caixa não deve receber a imunidade tributária porque suas funções e atividades não são iguais às da Ordem. Isso não é verdade, porque a caixa sempre apoiou a OAB, até para a expansão por todo o país, o que não é possível sem a caixa. A gente está investindo muito tempo para mostrar também o papel fundamental do órgão no sistema. A expectativa é de que em mais uns dois ou três meses, a questão esteja em pauta, e a expectativa é de que os ministros sejam sensíveis. ConJur — A OAB-RJ fez uma parceria com o Citibank para que os advogados que migrassem suas contas para o banco ficassem isentos de anuidade. Por que o convênio não foi renovado? Marcello Oliveira — Quando o Citibank fez a oferta, ela nos pareceu muito arrojada. Como funcionava? Qualquer advogado do Rio de Janeiro, abrindo conta no banco, com a condição de contratar um determinado serviço, teria a anuidade paga, mesmo se não mantivesse a conta aberta por um ano, como a gente pensou que eles exigiriam. Dissemos que só aceitaríamos o convênio se todo advogado fosse atendido. A adesão foi enorme. Isso causou problemas operacionais para o Citibank. Muitos profissionais saíam de suas cidades para a capital, porque a capilaridade do Citibank não é muito grande. As agências ficavam lotadas de advogados, os outros clientes não eram atendidos e o volume de recursos pago à Ordem foi enorme, superou R$ 6 milhões, à vista. Isso porque o banco pagou para nós as anuidades dos advogados que entraram no convênio. O banco não estava pronto para a enxurrada de pedidos de abertura de contas, e em alguns momentos eles sugeriram que os advogados que moravam longe das agências não seriam aceitos. Houve discussões sérias. Por conta dos atritos, a parceria acabou no ano seguinte, e eu duvido que volte, mesmo sendo interessante. ConJur — Como foi a atuação da Caarj durante as manifestações? Marcello Oliveira – Nós abrimos as instalações para que as pessoas se reunissem na caixa. Muitos voluntários apareceram, gente que não tinha qualquer conexão com a nossa atividade diária, mas que se interessou em participar do processo. No dia 20 de junho, nós participamos de dois episódios, eu na Faculdade Nacional de Direito e o Ronaldo Cramer, vice-presidente da OAB-RJ, no Instituto de Filosofia e Ciência Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Na FND, encontrei cerca de 200 estudantes acuados, porque os que saíram foram imediatamente revistados, os demais não queriam sair e eu me vi, às 23h30, com 200 alunos que precisavam ir para casa ou dormiriam nas dependências da faculdade, e nós conduzimos eles até o metrô. A Caarj ofereceu o espaço e participou da organização. Uma das coisas que me chamou a atenção foi que, entre as organizadoras deste grupo de voluntários, estava uma advogada muito atuante, que sempre trocava mensagens e direcionava os colegas. Eu perguntei quando conheceria ela, e me responderam que ela estava no Canadá. Isso mostra a força das redes sociais. ConJur — Sobre a reforma política, quais questões a CAARJ e a OAB colocam como prioritárias para 2016 e 2018? Marcello Oliveira — Para mim, o grande problema é de representatividade. Se os canais entre a sociedade e os partidos políticos não estivessem obstruídos, o Congresso talvez já teria discutido as propostas que o povo levou às ruas. Em meados da década de 1990, quando eu estava na faculdade, existia diálogo com núcleos de partidos políticos. Agora, os partidos em geral estão distanciados da discussão ideológica, que são presididos pelas mesmas figuras há décadas. Houve uma transformação econômica no país nos últimos anos, começando com o Plano Real, e as demandas também mudaram. Você precisa reconhecer essas necessidades, e quanto mais espaço as pessoas receberem para manifestar sua bandeira, mais fácil será a renovação dos partidos políticos. Do mesmo modo como eu acho que o processo pode aproximar as pessoas das instituições. A Caarj e a OAB se aproximaram dos advogados que quiseram se voluntariar e estão tentando trazer esses profissionais para trabalhar com a gente. Eu acho que essa deve ser a visão da instituição, que também precisa praticar a democracia interna. A Ordem defende, por exemplo, que a pessoa jurídica não seja doadora de campanha, já que empresa não vota e que só a pessoa física, o eleitor mesmo, pode apoiar seu candidato. O financiamento público também, apesar de muita gente dizer que é utópico. As distorções do sistema atual fazem com que se perca muito dinheiro, e se existisse uma forma de avaliar economicamente o sistema, talvez a conclusão fosse de que o financiamento público é melhor. Outra proposta do Movimento Eleições Limpas, apresentado pelo presidente Marcus Vinícius Furtado Coêlho para a presidente Dilma, é o sistema eleitoral em dois turnos para cargos legislativos. O povo vota em partidos no primeiro turno, o que fortaleceria as legendas. No segundo turno, com a delimitação das vagas a que cada partido teria direito, seria feita a votação nominal. Eu acho muito interessante, porque valoriza o partido, com todos os defeitos que ele tem, e depois decide o seu representante. O voto distrital tem uma desvantagem no caso de eleição para a Câmara dos Deputados, porque o deputado federal deve levar pautas de relevância em âmbito federal, ele não está ali para resolver os problemas de um ou outro bairro. Ou seja, ele tem uma grande vantagem do ponto de vista econômico, mas tem defeitos no que diz respeito ao processo político. Pessoalmente, eu sou contra a coligação proporcional, porque estou votando em um candidato, e depois descubro que o meu voto ajudou a eleger outra pessoa. Quem se interessa pela dinâmica eleitoral sabe quais são as coligações, mas mesmo essa pessoa mais politizada, quando escolhe seu candidato, ela não quer votar em um sujeito daquela coligação, que às vezes acaba eleito enquanto o seu candidato não foi. Independente das bandeiras pontuais, eu acho fundamental comemorar que as pessoas estão nas ruas, se manifestando, com pautas de qualidade. Ao contrário do que muitas pessoas disseram, este é um movimento inteligente, que soube o momento correto de ir para as ruas e de recuar para não ser capturado pelos interesseiros. Eu acho que é o grande fenômeno histórico desse momento.]]>