A promulgação da nova Lei dos Royalties — a Lei 12.734/2012 — pelo Congresso Nacional no fim de 2012, depois de uma batalha entre estados pelas compensações bilionárias da extração de petróleo e gás, colocou um imbróglio no colo da Advocacia-Geral da União, responsável por defender os Poderes da República no Judiciário e assessorar juridicamente a Presidência na tomada de decisões. Como a presidente Dilma Rousseff, aconselhada pela AGU, vetou artigos da lei que redistribuíam a todos os estados e municípios royalties de concessões de campos de petróleo já em exploração que iam, em sua maior parte, para os cofres de estados e municípios produtores, a AGU ficou, diante de questionamentos no Supremo Tribunal Federal, dividida entre defender os vetos e a lei na íntegra.
A solução, acertada depois de muitos debates na cúpula do órgão, foi defender os dois lados. A favor dos vetos — derrubados pelo Congresso — e contra a versão da lei que acabou prevalecendo, falaria a Consultoria-Geral da União, que tem a incumbência de assessorar a presidente. Em defesa da lei e do Congresso Nacional, manifestou-se a Secretaria-Geral de Contencioso da AGU. Ambas as manifestações, antagônicas, foram entregues ao Supremo para municiar os ministros para decidir nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4.916, 4.917 e 4.918, ajuizadas por estados produtores de petróleo.
O episódio revelou a complexidade do papel da AGU na defesa de entes públicos. Segundo o advogado-geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, não foi a única vez em que a AGU deparou com a escolha entre qual interesse defender. Batalhas que opuseram o Conselho Nacional de Justiça e tribunais, devido a punições a magistrados ou regras que alteravam a rotina das cortes, por exemplo, obrigaram a AGU a adotar a solução derradeira: nomear um de seus advogados públicos como advogado “ad hoc”, encarregado de defender um dos lados, desobrigando-o, temporariamente, de se submeter às regras de subordinação que a carreira impõe ao advogado-geral da União no exercício da função.
Para reduzir o impacto dessas disputas, a AGU tem levado embates de dentro do governo à sua Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal, o que evita a judicialização. Dívidas de tributos de autarquias, por exemplo, têm sido resolvidas por acertos orçamentários, e não mais por execuções fiscais. “Resolve-se orçamentariamente, porque não temos uma pessoa jurídica una, mas temos um orçamento uno, todos têm a mesma fonte orçamentária”, explica Adams.
Segundo informações da AGU, desde 2007, a câmara pôs fim a 152 disputas travadas dentro do poder público. Algumas matérias já estavam judicializadas em várias instâncias. Com a solução extrajudicial, as ações foram extintas com julgamento de mérito. O Monitor de Processos em Conciliação da câmara identifica a soma de R$ 8 bilhões em valores de processos que deram entrada no órgão, mas esse número não revela o tamanho da vantagem.
“Nas conciliações, os valores financeiros não são aferidos como vetores de maior importância, pois os acordos feitos entre órgãos e entes da Administração Pública não se medem por valores, mas sim pelos resultados imateriais que são alcançados em favor das políticas públicas. Um exemplo são as controvérsias entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e a Fundação Cultural Palmares sobre superposição de reservas biológicas com terras quilombolas”, explica Adams.
Não é a única estratégia de Adams para aperfeiçoar o trabalho do órgão. Sua menina dos olhos é o projeto de Lei Orgânica da AGU — o PLP 205/2012, que tramita na Câmara dos Deputados. A proposta resolve uma série de problemas da carreira, como a separação hoje existente entre os procuradores federais que atuam em autarquias — como o Banco Central, o INSS, agências reguladoras ou universidades federais — dos advogados da União lotados em órgãos específicos da AGU. Com a mudança, todos passam a se submeter ao mesmo chefe e a ter o mesmo orçamento e o auxílio de profissionais das carreiras de apoio.
Hoje, a AGU conta com 7.788 membros em quatro carreiras jurídicas. Do total, 1.635 são advogados da União; 4.029 são procuradores federais; 1.940 são procuradores da Fazenda Nacional; e 184 são procuradores do Banco Central. Somam-se a esses os 24 assistentes jurídicos e os cerca de 4 mil servidores administrativos.
O texto em debate no Congresso, no entanto, é criticado por associações da classe. Os principais alvos são o espaço garantido em funções comissionadas para advogados não concursados e escolhidos pelos gestores públicos, inclusive para chefias, e as punições para profissionais que errarem ou desobedecerem ordens superiores. Segundo Adams, no entanto, a maior parte das alegações se deve a interpretações radicais do texto e a falta de informação. Os riscos, segundo ele, são maiores com a lei atual, a Lei Complementar 73, de 1993.
Sob o comando de Adams desde outubro de 2009, a AGU contabiliza, entre 2010 e 2012, ter gerado arrecadação ou economia de um total de R$ 2,133 trilhões aos cofres federais. Só no Supremo, as principais brigas hoje são, além dos royalties, a política tarifária de transporte aéreo (Recurso Extraordinário 571.969); os expurgos inflacionários decorrentes dos planos econômicos (RE 626.307); a defesa da Lei Geral da Copa (ADI 4.976); e do programa Mais Médicos do governo federal (MS 32.224 e MS 32.238); a desaposentação (RE 661.256); e a exigência de que pedidos previdenciários sejam feitos primeiro administrativamente e, só depois, na Justiça (RE 631.240).
Também estão sob monitoramento constante processos envolvendo as obras do Programa de Aceleração do Crescimento do governo federal, como a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte; a Copa do Mundo de 2014; os Jogos Olímpicos de 2016; e o Exame Nacional do Ensino Médio. Ao todo, são cerca 23 milhões de processos, incluindo a atuação das quatros carreiras jurídicas da AGU.
Segundo o órgão, as atenções estão voltadas especialmente para os leilões de imóveis de Jorgina de Freitas, condenada por fraudes ao INSS; e a ações regressivas, como as ajuizadas em relação ao incidente na boate Kiss, em Santa Maria (RS), que matou 242 pessoas em janeiro. A AGU cobra R$ 1,5 milhão dos sócios da boate, como ressarcimento de valores gastos pelo INSS com a pensão por morte e auxílio doença de beneficiários da Previdência.
Adams atendeu à ConJur por telefone nos dias 12 e 15 de julho, de seu gabinete. Falando com tranquilidade, não deu prazo para desligar, nem se esquivou das perguntas. A conversa teve de ser interrompida apenas porque o ministro foi chamado para falar com urgência com a presidente — situação a que está acostumado, por se repetir na gestão Lula. Demonstrou certa impaciência ao falar das críticas das associações da classe, mas enumerou-as e rebateu cada uma delas.
Nesta entrevista, além de explicar o projeto de nova lei orgânica em detalhes, o ministro fala ainda sobre o pagamento de honorários de sucumbência a advogados públicos, protesto em cartório de multas de órgãos contra empresas, atuação de procuradores da Fazenda como assessores de ministros e desembargadores e a ideia de reforma política anunciada pela presidente Dilma. Segundo ele, a AGU não foi consultada para opinar sobre o “processo constituinte específico” sugerido pela presidente.
Leia a entrevista:
ConJur — A atuação no caso da Lei dos Royalties é um exemplo da complexidade do papel híbrido da AGU? Luís Inácio Adams — As manifestações da AGU nos dois sentidos são de pessoas diferentes. A presidente, ao oferecer informações ao Supremo, é assessorada pela AGU, que lhe dá elementos. Já a defesa da lei é do advogado-geral da União, não é da AGU. Nesses dois casos, a manifestção está de acordo com a visão de quem efetivamente a faz. O que há de interessante na manifestação do advogado-geral é que ela é vinculada. O advogado-geral tem obrigação de manifestar argumentos de defesa do ato, independentemente de sua visão sobre o tema. Convicção pessoal fica em segundo plano em relação à obrigação profissional. Porque é preciso haver um curador que defenda a lei.
ConJur — O advogado-geral vai sempre defender uma lei questionada no Supremo? Luís Inácio Adams — Tem se admitido exceções de duas ordens. A primeira é quando há posicionamento anterior do Supremo sobre o tema. É comum acontecer nos casos de guerra fiscal. O Supremo tem reiteradamente decidido que leis que concedem benefícios fiscais nos estados têm que ter a aprovação do Confaz [Conselho Nacional de Política Fazendária]. Se não tiver, é inconstitucional. Isso autoriza o advogado-geral a não defender a lei. Nesse caso, o próprio estado se faz presente como amicus curiae. Outra situação em que isso pode acontecer é quando há sobreposição de competência, quando um estado aprova uma lei sobre assunto em que a competência concorrente é da União. Se o estado avançar sobre a competência da União, temos de fazer a opção. Há ocasiões em que não há como defender as duas normas. Há ainda outra possibilidade, que é quando há interpretação da lei conforme a Constituição, sem redução de texto, ou seja, quando há mais de uma forma de se interpretar uma lei. Aí a AGU faz a opção quanto ao lado em que vai atuar, porque a lei não vai ser eliminada do mundo jurídico.
ConJur — Nos exemplos que citou, a AGU atua sempre de um lado só. Já no caso da defesa da Lei dos Royalties, a defesa é dos dois lados. Luís Inácio Adams — É uma atuação diferenciada. Em casos como esse, o advogado-geral é incumbido pela Constituição Federal de defender a lei contestada. Há situações em que ele deve colocar de lado as próprias convicções pessoais para defender a lei, como manda a Constituição.
ConJur — Como fazer isso com honestidade intelectual? Luís Inácio Adams — No Direito, você faz prospecção de possibilidade de aplicação da legislação. As interpretações, muitas vezes, não são convergentes. Aliás, a divergência de compreensão da lei é que gera pretensões e resistências. Então, há na aplicação do Direito grande dificuldade de se obter uniformidade de entendimento. Uma coisa é a convicção pessoal daquilo que entendo como correto na aplicação da lei. Por exemplo, no caso dos royalties, defendi e propus à presidente os vetos, porque entendi que estava correto, mas ao defender um entendimento, eu não posso ignorar que existem argumentos objetivos que podem ser apresentados e sustentem uma posição divergente. Então, há uma diferença entre a convicção e os elementos objetivos que sustentam uma posição ou outra.
ConJur — Foi por isso que o senhor cogitou, mesmo defendendo a constitucionalidade da lei, pedir a modulação da decisão do Supremo? Luís Inácio Adams — Claro. O ponto nuclear e a honestidade na atuação de um advogado que assume a defesa de uma parte estão associados a essa lealdade com a defesa do interesse que motiva a sua obrigação.
ConJur — O mesmo que faz um advogado privado, então? Luís Inácio Adams — Exatamente a mesma coisa. Nós não somos juízes, alguém que decide, delibera. Atuamos vinculados a um interesse do Estado, da Administração e, no caso concreto dos royalties, no interesse da legitimidade da lei, que foi aprovada pelo Congresso. Então, alguém tem que defender essa lei. Esse é o vínculo de obrigação.
ConJur — Para definir essa estratégia no caso dos royalties, a cúpula da AGU debateu profundamente a questão. Esse modelo constitucional de atribuir à AGU tanto a defesa da lei quanto a defesa dos vetos é o ideal? Luís Inácio Adams — Há outros modelos de representação mais contraditórios do que esse. Nos países de língua portuguesa e língua espanhola, normalmente se preserva um modelo anterior ao da nossa Constituição de 1988, que é aquele em que o Ministério Público da União tem a função de representar os dois lados, embora a Argentina e a Espanha já tenham criado sua advocacia pública. Nos Estados Unidos, por exemplo, o attorney general é cargo do Poder Executivo. Ele é responsável por conduzir toda a investigação policial e toda a acusação criminal no país, muitas vezes, contra o governo. O fato é que o Estado atua em vários setores: energia, indígena, ambiental, agrário etc. Ele executa projetos e defende direitos da população. Muitas vezes, o setor agrícola se opõe ao setor de energia ou indígena. O Estado não é imune a esse conflito e é bom que não seja. E os agentes do Estado acabam participando desse conflito. Nós, na AGU, também vivemos isso. Os advogados da Funai e os advogados do Ministério da Cultura debatem posições diferentes, que refletem a visão do “cliente” de cada um, a quem eles prestam assessoria. Essa contradição é inerente à realidade estatal.
ConJur — E como se resolvem dilemas entre advogados públicos de órgãos com interesses antagônicos? Luís Inácio Adams — Quando o conflito se torna impossível de permitir um consenso, sobe para uma instância mais independente, que é a AGU, porque a AGU não é vinculada a nenhuma dessas áreas. É por isso que defendo e insisto na lógica da hierarquia que a instituição deve, para preservar essa unidade e o nível de coerência e de estabilidade. Porque o sistema, se deixado à atomização dos indivíduos, se torna impossível de funcionar. Tivemos um exemplo recente no Ministério Público Federal, em que o procurador-geral defendeu uma posição no Supremo, mas sua substituta entendeu de forma diferente e apresentou outro parecer no processo [o Mandado de Segurança 32.033, em que se questiona a tramitação do Projeto de Lei 4.470/2012, que restringe a criação de novos partidos políticos]. Esse fato mostra como a atomização acaba expondo e fragilizando a organização. Ela fica incapaz de produzir segurança para o Estado.
ConJur — Outro exemplo de dupla prestação de contas é o dos procuradores da Fazenda Nacional, que estão tecnicamente vinculados à AGU, mas, operacionalmente, ao Ministério da Fazenda. O anteprojeto levado pelo Executivo ao Congresso para a nova Lei Orgânica da AGU altera essa construção? Luís Inácio Adams — Não. Ele torna mais claro o nível de vinculação técnica que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional tem que ter em relação à AGU, seja do ponto de vista da competência do advogado-geral para supervisão, seja do fortalecimento da capacidade de atuação nas questões jurídicas, mas preservando o que é essencial da Procuradoria no relacionamento interno, que é a direção administrativa que compete ao Ministério da Fazenda, no caso de áreas como a tributária. Por que a PGFN está hoje no Ministério da Fazenda? Por que ela não está na AGU? Fundamentalmente porque a Procuradoria tem uma competência que, na maioria dos países, é administrativa, mas aqui, é judicializada, que é a cobrança. Na maioria dos países, a cobrança pode ser judicializada pela parte, mas sua execução é administrativa.
ConJur — Há um projeto de lei que tornava a execução fiscal administrativa. Como está a tramitação? Luís Inácio Adams — O projeto propunha um sistema misto. Estamos tentando negociar um encaminhamento. Já o projeto da Lei Orgânica faz com que a PGFN tenha que ter uma forte vinculação com o setor da Receita Federal que atua no lançamento, na constituição do crédito, ou seja, há um cordão umbilical aí.
ConJur — Mais do que com a própria AGU? Luís Inácio Adams — Nesse aspecto sim. No aspecto judicial, não, a relação é eminentemente com a AGU. Mas se a PGFN estivesse hoje na AGU, haveria um prejuízo nessa relação. Porque a Receita Federal veria a AGU como uma instituição externa e aprofundar o fosso desse relacionamento, prejudicando o pessoal de cobrança.
ConJur — Muitos contribuintes reclamam que as informações não são trocadas entre o Fisco e a PGFN, o que dificulta a regularização de pendências. Luís Inácio Adams — Há muitos problemas de comunicação. Fizemos um esforço muito grande entre 2006 e 2009 para aprofundar o que nós chamamos de macro-processo tributário, tanto eu quanto o secretário Nelson Machado [ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda] e o ministro Guido Mantega [Fazenda]. O trabalho foi para criar um processo único em que os atores desse processo, seja a Receita Federal, seja o Conselho Contribuintes [hoje Conselho Administrativo de Recursos Fiscais], seja a Procuradoria da Fazenda Nacional, tivessem uma ação coordenada e essa separação não fosse prejudicial ao contribuinte. Um exemplo prático é o do atendimento único, um modelo de atendimento à sociedade em que a separação entre a Receita e a PGFN não fosse algo que prejudicasse o contribuinte, como era no passado, quando a pessoa tinha que comparecer em cada um dos órgãos. É por isso que, do ponto de vista do benefício à sociedade, a presença da PGFN no Ministério da Fazenda hoje é a solução mais benéfica.
ConJur — Uma das estratégias da AGU para se aproximar dos órgãos tanto para assessorá-los quanto para defendê-los são os chamados escritórios avançados, como os que existem no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no Superior Tribunal de Justiça e no Conselho da Justiça Federal. O que fazem esses escritórios e por que não há um no Senado, por exemplo? Luís Inácio Adams — O escritório avançado surgiu para que a AGU pudesse oferecer esses serviços para os demais Poderes da República. Nós já defendemos o Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal de Contas da União, tribunais regionais federais etc. Por isso, instalamos essas unidades. Foi o que aconteceu na Câmara dos Deputados. Ela tinha uma procuradoria, que é inclusive titulada por um parlamentar, e nós instalamos, mediante convênio com a Câmara, uma representação que presta serviços fundamentalmente judiciais.
ConJur — Consultivo não? Luís Inácio Adams — Não. Consultivo não é nossa competência nem junto à Câmara, nem junto ao Senado. Nossa atuação é exclusivamente judicial. Não que às vezes o Senado ou a Câmara não peçam pareces. Já aconteceu no passado. Mas essas manifestações da AGU não produzem o efeito que produzem, por exemplo, no Executivo, que se tornam a opinião oficial e vinculam toda a área jurídica da União. Um parecer da AGU aprovado pelo presidente do Senado não vincula nada. Não fizemos o mesmo no Senado porque a casa tem uma estrutura de advocacia mais estruturada. O presidente José Sarney (PMDB-AP) não viu necessidade.
ConJur — Mas não é a AGU quem defende judicialmente o Senado também? Luís Inácio Adams — Sim, é quem defende o Senado. Esse intercâmbio entre o Senado e a AGU hoje se dá com a Advocacia do Senado.
ConJur — A Advocacia do Senado pode representar a casa no Supremo? Luís Inácio Adams — Ela não tem representação legal, mas o Supremo tem admitido algumas situações, como quando há conflito de interesses entre a posição do Senado e a do Executivo. Temos jurisprudência no sentido de que o Congresso pode constituir representação própria, mas é admitida apenas essa exceção.
ConJur — Em julgamento sobre a nova Lei dos Royalties, a Advocacia do Senado ajuizou um Agravo no Supremo, sendo que a AGU já está cumprindo esse papel de defender a lei. Ela poderia? Luís Inácio Adams — Poderia. A representação judicial junto ao Supremo não tem por pressuposto a pessoalidade jurídica. No caso concreto, o Agravo foi feito, salvo engano, com a assinatura do próprio presidente da casa — autoridade coatora no Mandado de Segurança impetrado — e não só pela Advocacia do Senado. Há alguns casos em que o Judiciário tem admitido que a própria autoridade possa promover o recurso.
ConJur — No caso julgado pelo Supremo que colocou em lados opostos o Tribunal de Contas da União e o Conselho Nacional de Justiça devido à regra que proíbe o nepotismo, a AGU também teve de defender os dois órgãos. Qual foi a solução? Luís Inácio Adams — Esse é um exemplo em que essa ambiguidade da AGU fica mais saliente. Não é como nos royalties, em que se distingue o papel do assessor que presta elementos para a decisão dos vetos — que é mais uma função consultiva — daquele que vai defender a lei judicialmente. No caso envolvendo TCU e CNJ, assim como nos casos de decisões do CNJ contra outros tribunais, a AGU é obrigada a defender os dois. De um lado está o CNJ, que determina uma obrigação para o tribunal. De outro está o tribunal, que quer resistir porque entende que essa obrigação é ilegal ou inconstitucional. Tenho até outros casos em que tomei a iniciativa de questionar decisões. Por exemplo, essa questão do auxílio alimentação que os juízes pretendem. Quando o STJ e os tribunais deliberaram pelo pagamento retroativo, eu entrei com uma Ação Cível Originária contra essa decisão. Está em tramitação no Supremo, com o ministro Fux. Nesse caso, a própria AGU entrou com a medida. E quem defende a decisão dos tribunais? Eu designei advogados da União para isso. São advogados ad hoc. Mas como resolver isso internamente? A atuação desses advogados, nesse caso específico, não é mais supervisionada pelo advogado-geral. Eles são supervisionados pelo próprio interessado, pelo próprio tribunal. Eles são quase advogados privados. Só não são privados porque têm uma responsabilidade com o tribunal e essa responsabilidade é aferida pela Corregedoria da AGU. O advogado-geral não faz mais essa supervisão direta, que é feita pela Corregedoria.
ConJur — Também no caso das ações populares movidas contra membros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda, a advocacia pública atuou dos dois lados. Um parecer da PGFN deu razão às ações que alegavam que o órgão estava lesando o erário ao julgar nulas autuações fiscais. Mas a AGU assumiu a defesa dos conselheiros e do Carf na Justiça. Qual foi a estratégia? Luís Inácio Adams — Eu avoquei a representação. Porque a PGFN se viu em uma situação contraditória. De fato houve manifestações favoráveis às ações, mas nós entendemos que elas foram indevidas. O problema é que a PGFN tem, em casos judiciais diferentes desse das ações populares, posição em conformidade com os fundamentos dessas ações. Então, a Procuradoria-Geral da União assumiu esse caso, com manifestação e defesa. A PGFN não está presente nesses processos.
ConJur — O CNJ julga se procuradores da Fazenda podem ser assessores de desembargadores em tribunais de segundo grau. Já houve liminar proibindo a convocação no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, mais tarde cassada pelo Supremo. Também nesse caso a AGU teria de defender o CNJ de um lado e o TRF de outro? Luís Inácio Adams — Se houver pedidos dos tribunais nesse sentido, nós vamos atuar, sim.
ConJur — Qual a sua posição a respeito do mérito do assunto? Luís Inácio Adams — A lei autoriza a cessão, mas para os tribunais superiores e Supremo. Mas eu não concordo com o fundamento da crítica, de que a atuação do advogado público na assessoria do ministro ou do juiz representa um desvirtuamento ideológico da jurisprudência porque haveria uma “influência desmedida” de advogados públicos no processo. O mesmo argumento eu posso usar no sentido contrário. Se advogados que vêm de escritórios não pudessem atuar em tribunais, não seria possível que o ministro Barroso, recém-empossado no Supremo, por exemplo, trouxesse para o seu gabinete pessoas que eram do seu escritório. É errado ignorar o juízo crítico do julgador. Não há assessor que diga: “não, o senhor está errado”. Ele pode debater os argumentos. Achar que o assessor é mais importante que o juiz é um absurdo. Além disso, a advocacia pública é muito rica de compreensões, de entendimentos, de visões diferenciadas. Não somos uma seita, um serviço religioso, mas uma organização complexa, de diferentes visões.
ConJur — Se a AGU pode nomear advogados “ad hoc” para contemplar a ampla defesa de órgãos adversários em uma disputa judicial, o recente concurso organizado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo para contratação de advogado exclusivamente para o tribunal deve ser entendido dessa forma? Luís Inácio Adams — Esse advogado pode prestar assessoramento jurídico ao Tribunal de Justiça, porque isso a Procuradoria-Geral do Estado, pela Constituição, não oferece senão para o Poder Executivo. Mas ele não pode exercer a representação judicial, exceto na situação em que há conflito de interesse entre o Executivo e o Judiciário. O Supremo já decidiu isso em outros casos, como em um julgamento em que o TRF da 3ª Região foi ao Supremo com advogado próprio. O Supremo não reconheceu o advogado deles. O caso era sobre um processo eleitoral da diretoria da corte.
ConJur — As Câmaras de Conciliação da AGU nasceram com o intuito de pacificar conflitos entre órgãos públicos. Como está o trabalho? Luís Inácio Adams — O projeto vem desde o ministro José Bonifácio Borges de Andrada e foi aperfeiçoado pelo ministro José Antônio Dias Toffoli. Hoje, já há muitas soluções negociadas. Quando eu assumi a PGFN, havia Execução Fiscal proposta na Justiça contra órgãos da administração, como o Ministério do Exército. Era um absurdo. Agora, já não é aceitável que a União atue contra a União, até porque nós incorporamos o entendimento de parecer em que eu aprovei o “instituto da confusão”. O Código Tributário Nacional não prevê a extinção do crédito tributário por causa da confusão de pessoas jurídicas de Direito Público, todavia, nós entendemos que era necessária essa compreensão como regra de extinção do crédito. Ou seja, não é possível a proposição de execução judicial da União contra a União. Estamos estendendo esse entendimento para as autarquias e fundações. Quando há uma disputa tributária, por exemplo, uma cobrança de contribuição previdenciária de uma autarquia, não se propõe execução, mas se resolve isso orçamentariamente. Tenta-se conciliar administrativamente ou até mesmo leva-se a discussão ao Carf, mas não judicializamos uma execução. Resolve-se orçamentariamente, porque não temos uma pessoa jurídica una, mas temos um orçamento uno, todos têm a mesma fonte orçamentária.
ConJur — Isso não tira o direito de uma universidade federal, por exemplo, ir à Justiça contra uma cobrança que acha indevida? Luís Inácio Adams — Eu não vejo assim, porque são todos órgãos da Administração. Todos têm o mesmo patrão e todos têm o mesmo orçamento. Se um órgão cobra de uma faculdade e ganha uma ação na Justiça, no que vai resultar? Em um precatório. Esse precatório é lançado onde? No orçamento geral da União. Que vai creditá-lo para quem? Para o orçamento geral da União. O resultado disso é absurdo. A única razão de preservar essa disputa internamente não é tributária, mas vinculativa. Muitas receitas são vinculadas, isso faz parte da divisão. Só que esse acerto deve ser orçamentário, não judicial.
ConJur — O projeto de Lei Orgânica da AGU pune o advogado público por erro grosseiro. Qual é a definição para erro grosseiro? Luís Inácio Adams — Erro grosseiro é uma expressão que já está na legislação, não é novidade. O que procuramos definir foi que erro grosseiro é aquela culpa extremada, digamos assim. Não é culpa média, não é culpa normal. Culpa é por uma imperícia, uma negligência, uma imprudência. Se eu pratiquei um ato com imperícia, se fui negligente ao fazer meu parecer, não fiz com a perícia necessária e isso é um erro. A culpa normal decorre do erro e isso não é passível de punição. Se em meu parecer não menciono jurisprudência, isso é uma imperícia, mas também não é essa imperícia que gera punição, e sim a imperícia extrema. É quando eu faço um parecer e deixo de observar uma súmula vinculante do Supremo. Isso é um erro grosseiro, porque essa imperícia é grave, levando em conta que a súmula vinculante tem força vinculativa. Ou quando deixo de citar um parecer normativo aprovado pelo Presidente da República. É uma situação de erro claro e exagerado.
ConJur — Por que criar a punição? Luís Inácio Adams — Porque a função da nossa atividade consultiva é dar proteção ao nosso administrador, dar segurança para ele. Ele, quando decide seguindo um parecer, não pode ser punido por isso. Eu, como advogado, não posso ser punido por dar um parecer. Tenho uma liberdade de opinião ao orientar meu cliente. Mas isso não quer dizer que posso opinar como quero. Não pode ser algo subjetivo, atomizado. Devo ter responsabilidade com meu cliente, que é quem recebe o parecer e toma as decisões com base nele.
ConJur — Qual é a responsabilidade do gestor público se ele agir de acordo com a orientação jurídica? Luís Inácio Adams — Seguindo ou não a orientação jurídica, ele está passível de questionamento. A vantagem é que o parecer jurídico dá ao administrador pelo menos a confiança de que ele está sendo respaldado pela instituição.
ConJur — Essas definições de o que é erro grosseiro estão no projeto? Luís Inácio Adams — Podemos até tentar aprimorar isso no texto se necessário, mas depende de situações concretas. É preciso saber se o advogado tinha acesso à informação, se estava com os elementos presentes, se houve algum fator externo objetivo que o impediu de ter acesso à informação. É no caso concreto que se apura o erro grosseiro. O que acontece é que hoje o advogado está mais exposto. Hoje ele responde pela culpa simples. O TCU aplica a penalidade ao advogado se ele der um parecer diferente do entendimento da corte, essa é a gravidade. O Ministério Público pode entrar com uma ação de improbidade contra advogados públicos simplesmente porque eles não adotaram o entendimento que o MP acha certo. Ou seja, eu sequer tenho liberdade de opinião.
ConJur — São muitas as ações de improbidade nesses casos? Luís Inácio Adams — Não. Houve várias tentativas, mas nós estamos trabalhando com elas. Mas o TCU tem aplicado multas quando entende que o ato administrativo não está correto, e estende a penalidade ao advogado que deu parecer. Hoje, o sistema de atuação da advocacia pública não está adequadamente protegido.
ConJur — Haverá uma regulamentação dessas definições? Luís Inácio Adams — Eu acho que sim, mas essa é uma função da Corregedoria. É ela quem vai aprofundar esses conceitos.
ConJur — O projeto prevê também uma punição por insubordinação. Como vai funcionar? Luís Inácio Adams — Insubordinação é a não observância das orientações superiores. Isso é necessário porque a efetiva atuação do advogado precisa considerar o direcionamento. Temos dois tipos de orientação. Temos a hierarquia técnica e temos a hierarquia administrativa. A hierarquia técnica se estabelece por meio de instrumentos normativos, como pareces do advogado-geral e orientações da Consultoria-Geral da União. O advogado público tem a obrigação de conhecer e apresentar essas posições aos seus órgãos consulentes. O advogado, ao se manifestar, não pode deixar de apresentar essas orientações técnicas, o que não significa que não possa ressalvar sua discordância.
ConJur — Então, se o advogado apenas desobedecer uma orientação de um superior, não sofre punição? Luís Inácio Adams — Não. Onde está isso na lei? O chefe está tão subordinado às orientações gerais quanto o advogado. Mas há um segundo aspecto, que são as normativas administrativas. Também existe uma hierarquia administrativa a que o advogado tem que se subordinar. Se, por exemplo, padronizamos o modelo de aceitação de crédito para garantia em Execuções Fiscais, essa padronização tem que ser observada, inclusive na manifestação judicial. Falo de um exemplo concreto. Eu padronizei a regra de seguro-garantia e as posições das procuradorias ficaram submetidas a isso. Mas houve quem não seguisse. A Corregedoria, na época, não quis fazer nada, porque achava que não haveria essa subordinação, o que é um absurdo. Porque era preciso padronizar as regras de aceitação do seguro-garantia. Não se pode ter uma posição em São Paulo, outra no Rio, outra no Recife e outra em Porto Alegre. O cidadão tem direito a ter uma posição uniforme da AGU. Isso é regra de hierarquia básica, que permite um tratamento uniforme às pessoas.
ConJur — O advogado pode ser compelido a fazer um parecer com um embasamento jurídico que acha indevido por ordem de seu superior? Luís Inácio Adams — A atuação das chefias imediatas é uma atuação de orientação e organização, mas ela tem limites e esses limites estão na lei. A chefia pode discordar do parecer e não aprová-lo, passando adiante para debate. Isso é uma prerrogativa dela, mas ela não pode chegar, por exemplo, e dizer: “advogado, aja dessa maneira”. Ela pode dialogar. Normalmente, o que acontece em uma instituição em que há coletividade é diálogo, discussão, até se fechar uma orientação. Mas a posição final é da instituição, fechada pelo chefe de cada órgão que, por sua vez, provoca a instância superior para seguir adiante. Mas isso não impede que o advogado faça sua ressalva pessoal. Eu duvido que isso aconteça em um escritório privado. Fazemos debates internos. Quanto mais uniformidade e convicção existir, melhor. Recentemente tive um posicionamento de um ministério sobre um tema de repercussão para vários outros ministérios. Chamei as consultorias de todos — umas seis — e debatemos. No fim, o que parecia ser a solução era o contrário do que achávamos.
ConJur — A desobediência ao superior imediato não ameaça a carreira do advogado, então? Luís Inácio Adams — Isso não existe. O advogado da União está protegido por várias garantias, como a estabilidade, que impedem esse tipo de intervenção. Além disso, na Advocacia-Geral da União, o superior não tem poder disciplinar. Quem tem esse poder é a Corregedoria, que é uma instância autônoma. No caso dos pareceres, a manifestação é da instituição. Se eu entrego um parecer à presidenta da República e ela diz que aquilo é um absurdo, tenho que alterar, porque a manifestação é dela, não minha.
ConJur — A presidente Dilma pediu algum parecer da AGU antes de sugerir um “processo constituinte específico” para fazer a reforma política? Luís Inácio Adams — Não, nós não participamos desse processo.
ConJur — O projeto de Lei Orgânica permite a vinculação à AGU de advogados comissionados não concursados, o que tem sido criticado. Qual é a ideia? Luís Inácio Adams — A proposta de lei aumenta a reserva legal de cargos comissionados para advogados públicos para mais de 500 posições. Ou seja, ninguém vai me convencer de que uma lei que expande a reserva legal dos atuais 66 para 500 significa uma fragilização da instituição.
ConJur — Quantos advogados de fora da carreira trabalham hoje em postos da AGU? Luís Inácio Adams — É difícil dizer porque há muitos cargos de assessoria. Cargo de assessoria não pode ser considerado exclusivo de carreira. Aliás, a demanda que tenho em relação às consultorias jurídicas é acabar com o cargo de assessor, é que os cargos sejam só de direção, porque a própria função do advogado já é de assessoria. Não faz sentido ocupar um cargo em comissão de assessor.
ConJur — A norma vai efetivar comissionados de fora da carreira? Luís Inácio Adams — A lei atual já fala isso. Os consultores jurídicos de fora são membros da AGU. O projeto de lei apenas expande a reserva legal para advogados públicos. Atualmente, quase 90% dos cargos são ocupados por pessoas de carreira, mas a lei em vigor permite que quase todos os cargos sejam preenchidos por comissionados, porque reserva apenas 66 para advogados públicos.
ConJur — O advogado não concursado que tem cargo comissionado na AGU não vai ser efetivado? Luís Inácio Adams — Não. A palavra não é efetivação. O que ele tem são prerrogativas e disciplina. Um consultor jurídico de um ministério, ao exercer a função na AGU, tem as prerrogativas de quem é de carreira. Enquanto ele perdurar na função, vai ter as prerrogativas próprias, ou seja, tem que ser processado por uma Corregedoria, vai ter o direito de fazer manifestação, vai se submeter aos mesmos direitos e obrigações que os advogados já se submetem.
ConJur — O projeto de Lei Orgânica tem sofrido duras críticas. O que há de bom nele? Luís Inácio Adams — Estou completando 20 anos de carreira e é a primeira iniciativa que vejo de aprimorar a lei. Uma das qualidades do texto é a consolidação da instituição, ao incorporar na direção superior a Procuradoria-Geral Federal e a Procuradoria-Geral do Banco Central, duas instituições que estão hoje na periferia da AGU, porque não fazem parte da direção, não participam do conselho superior da AGU. Do ponto de vista legal, não estão em uma posição equivalente à dos demais órgãos da AGU.
ConJur — E o que faz esse conselho superior? Luís Inácio Adams — Hoje, basicamente, organiza o concurso de promoção. Mas no projeto de Lei Orgânica, esse conselho passa a ter uma função maior, papel estratégico, como o de definir regras ou, em termos de gestão, integrar ações, por exemplo.
ConJur — Com a integração da PGF, as procuradorias de autarquias passam a ter acesso às carreiras de apoio da AGU? Luís Inácio Adams — Passam a ter a mesma carreira, o mesmo orçamento, tudo. Hoje, há uma limitação. Por outro lado, a nova lei consolida a ideia de tentar reforçar a unidade jurídica da AGU, mesmo que a instituição seja administrativamente não unificada. Temos o Ministério AGU, que é menor do que a AGU como sistema, como instituição. Temos consultorias jurídicas, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, a Procuradoria-Geral do Banco Central, todas não estão no Ministério da AGU, ou seja, na estrutura administrativa da AGU, mas estão na estrutura jurídica, ou seja, participam das instâncias da AGU e compõem uma unidade do ponto de vista jurídico. A procuradoria especializada tem sua verba alocada no ministério em que ela está.
ConJur — Quantas procuradorias especializadas existem? Luís Inácio Adams — A AGU tem presença praticamente em mil unidades diferentes. São procuradorias seccionais, consultorias jurídicas em cada autarquia. Hoje são 153 autarquias, muitas descentralizadas do ponto de vista nacional.
ConJur — Entre as prerrogativas, há alguma menção à prisão de procuradores — determinada por juízes em casos de descumprimento de decisões judiciais pelos órgãos públicos? Luís Inácio Adams — Não. As prisões de procuradores já têm sido executadas contra a lei. Porque se coage mediante prisão para garantir a aplicação de uma ordem judicial que não é nem dirigida a um advogado, mas sim a terceiro. É o mesmo que condenar alguém por tráfico e se prender o advogado para coagir o réu.
ConJur — O projeto trata de pagamento de honorários de sucumbência aos advogados públicos? Luís Inácio Adams — Chegamos a propor quando tramitou dentro do governo a vinculação da sucumbência à instituição, mas isso acabou sendo retirado. É um tema que está em aberto. É possível que esse assunto volte na discussão da lei complementar, há um debate no Congresso Nacional. O que tenho dúvida é quanto a possibilidade de alocação direta à remuneração do advogado que recebe subsídio, porque o subsídio exclui qualquer parcela. Mas nada impede, por exemplo, que essas vernas sejam aplicadas na própria instituição. A não ser que se mude o modelo remuneratório.
ConJur — Há propostas de que a sucumbência seja revertida para um fundo administrado pelas entidades de classe. É possível? Luís Inácio Adams — É possível e interessante, porque faz todo o sentido. Até para otimizar o fundo, já que grande parte das condenações têm sucumbência mínima, quase inexistentes.
ConJur — Hoje é obrigatória a intimação pessoal do procurador? A nova Lei Orgânica trata disso? Luís Inácio Adams — Hoje, a intimação pessoal é obrigatória. O projeto não aborda a questão porque, com a informatização, não há essa necessidade. A intimação pessoal se torna fisicamente necessária quando o processo é físico, por conta, muitas vezes, da distância. Não há um acompanhamento das unidades em todas as varas federais. Há locais em que o advogado tem de se deslocar 400 quilômetros para depois voltar e fazer a defesa. Com a informatização, isso é superado, porque a intimação eletrônica se torna uma intimação pessoal.
ConJur — Com a criação dos novos TRFs, se a PEC não for derrubada pelo Supremo, qual o planejamento da AGU para acompanhar as mudanças? Luís Inácio Adams — Vamos estudar esse assunto. Já estamos analisando o projeto que o STJ preparou no fim do mês passado, antes do recesso. Pretendemos, a partir do próximo semestre, planejar isso. Porque embora nas cidades onde serão instalados os novos tribunais já haja unidades da AGU, serão duas instâncias, agora. O trabalho aumenta e o perfil da unidade muda. Vamos ter procuradores regionais nessas unidades. Hoje, são procuradorias estaduais.
ConJur — Novos concursos estão descartados? Luís Inácio Adams — Não, não estão descartados.
ConJur — A AGU tem protestado em cartório multas não pagas, lavradas por autarquias federais. Qual tem sido o resultado? Luís Inácio Adams — Desde o ano passado vimos fazendo isso. O resultado é muito positivo. Esse sistema é muito bom para pequenos valores, o que evita o ajuizamento de execuções. Mas tenho muita preocupação com a qualidade da dívida. Porque não podemos criar um constrangimento, que é o protesto, a restrição bancária, se a dívida não tem qualidade de cobrança. E nós temos também facilitado o processo de cobrança, feito muitos acordos. Tenho autorizado descontos em pagamentos, com resultados muito positivos.
ConJur — Quais foram? Luís Inácio Adams — No ano passado, durante a semana da conciliação, selecionamos em torno de 500 processos da Justiça Federal da 1ª Região para conciliar. Eram processo de cobrança. Fiz a consulta às autarquias respectivas, que concordaram, e nós abrimos um processo de negociação. Tivemos 97% de adesão para pagamento. Reduzimos juros e multas. Temos as cobranças do TCU também, nas quais estamos fazendo acordos também. Foi o que fizemos no caso do ex-senador Luiz Estevão, envolvendo a construção do fórum trabalhista em São Paulo. Segundo a Justiça, foram desviados R$ 169 milhões. Nós já recuperamos R$ 115 milhões — claro, sem considerar multas, juros e atualizações.
ConJur — Há procedimento de negativação na Serasa, também? Luís Inácio Adams — Não. Porque, a partir dos protestos, a Serasa já apropria a informação.
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